quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

A quem pertence a Terra?

É vergonha demais ao povo brasileiro
Não ter completado a obra da Abolição
Ter-se deixado guiar pelo interesseiro
Que usurpa aos pobres da Nação
Fazendo-os viver como nos tempos do cativeiro,
Dominando a terra pela força do dinheiro,
Mantendo a miséria como capataz da escravidão.

A terra que Deus criou para todo mundo
Não pode jamais ser de um só homem
Pois é da fertilidade da terra oriundo
O fruto do trabalho que sustenta e mata a fome
E se é sagrado o direito de viver profundo
Não pode o latifundiário vagabundo
Roubar do pobre até o que ele come.

Pois nenhum nasceu a não ser de mulher
Isso foi regra até para o nosso Salvador
Portanto, da mesma natureza, verdade é
Que somos iguais, sem tirar e nem pôr
O que nos difere é a ética, moral e fé
Mas no resto não há diferença qualquer
Posso isso garantir sem nenhum temor.

A terra não pertence a ninguém
A terra a todos pertence por herança
É pecado até vendê-la por qualquer vintém
Acreditando que o tesouro trará bonança
Mas se a Terra pertencesse a alguém
Seria de Deus; assim minha mente alcança,
Pois foi o Criador; mas nos deu a esperança
Quando se manifestou em Jerusalém.

Pois foi ali que Ele contra o rico admoestou
Alertando para o triste fim que o aguarda
Eis que tanto e muito tesouro juntou
Mas não há o que na chama não arda
Está no fim da vida, a estrada findou
Do tesouro guardado nada lhe adiantou
Nem mesmo seu manto, seu terno, sua farda.

Este Brasil que nasceu tão farto de terra
Dividido em capitanias, quintais fundos
Foi essa a semente que o progresso emperra
E que produz o amargo fruto do latifúndio
Que não tem planta e nem o gado berra
Improdutivo, a injustiça assim se encerra
Como a mais vergonhosa peste do mundo.

O lavrador pobre, expulso do campo seu
Não encontra na cidade onde se empregar
Descobre que tanto sacrifício não valeu
Que foram inúteis os lamentos e o rezar
E chora porque a esperança já morreu
Na cidade não tem nada que seja seu
Para a fome dos filhos poder matar

Mãos calejadas não sentem o flagelo
Porque a pele toda se endureceu
Do trabalho com a enxada ou o martelo
Em grossa casca a pele se converteu
Se as lágrimas fizessem esse serviço belo
Seria o coração duro como muro de castelo
Que nenhum inimigo jamais venceu.

Mas a tristeza embora massageie o coração
Não exercita esse músculo a ponto de enrijecê-lo
Mesmo que dite o ritmo em aceleração,
Ainda que exerça com muito maior zelo
O compasso do trabalho como na escravidão
Nem assim endurece o coração
Pois se trata de homem, não de camelo.

Terra, substantivo feminino, mulher
Violentada por postes, cercas de arame
Geme a dor do estupro, pede, requer
Que a justiça se faça contra esse infame
Que rouba os afagos e frutos que quer
Sem demonstrar amor ou carinho sequer
Sem se importar que o sangue alheio se derrame

A terra é de todos por herança divina
É do homem, das plantas e dos bichos também
Todos são interdependentes, a vida ensina
Uma mão depende doutra para o Amém
E se reconhece a vida como uma sina
A lei da fraternidade se determina
Instala-se a ética do comum bem.

A terra grita, geme toda a criação
Esgotados os recursos de seu ventre lindo
Devida a capitalista exploração
Pensando que o recurso fosse infindo
Acelerando o consumo e produção
Num ritmo intenso de aceleração
Os recursos da Terra foram exaurindo.

Mas que direito possuem eles sobre a Terra?
Se a posse do chão foi por meio de grilagem,
Ou tomada à força numa injusta guerra,
Ou com uso da violência e da capangagem,
Não importa onde: aqui ou na Inglaterra,
Se no campo, litoral ou no cume da Serra,
O nome de batismo disso é sacanagem.

Somos todos habitantes deste planeta
Deveríamos viver em comunidade
Numa casa sem muro e sem maçaneta
Para não excluirmos a humanidade:
Compartimentada em diversas saletas
Nossa humanidade ao do outro rejeita
Não enxerga a beleza da diversidade.

Ouço voz no deserto como profecia
Clamando pela justiça e honradez
Abandonando de vez a ganância que um dia
Foi a cicatriz da sua insensatez
Casando a liberdade com cidadania
União que dará o fruto da autonomia
Para recriar o Paraíso outra vez.

Carlos Carvalho Cavalheiro
05.01.2012