Não
é novidade que o presidente Bolsonaro obteve votos de muitos que se simpatizam
por governos ditatoriais e autoritários. Por diversas oportunidades, Bolsonaro
elogiou figuras dos tempos de repressão dos governos militares, como Brilhante
Ustra e generais que ocuparam cargos de presidentes de república. Enquanto
ainda era deputado, Bolsonaro, por suas declarações, angariava a simpatia de
grupos notoriamente neonazistas.
Em 9 de abril de 2011, por exemplo,
o grupo denominado “White Pride World Wide”[1]
organizou um Ato de apoio a Jair Bolsonaro no vão livre do MASP, em São Paulo.
Um ano depois, a revista Carta Capital noticiava o novo despertar do neonazismo
no Brasil sob uma pretensa liderança canalizada na esperança de assunção ao
poder por Bolsonaro.[2]
Em 2015, durante a votação do
impeachment da presidente Dilma Rousself, o então deputado dedicou o seu voto
“sim” ao que ele chamou de “heróis de 1964” e ao Brilhante Ustra, acusado de
ser um dos principais torturadores do regime militar.
É de se esperar, portanto, que haja
uma expectativa dos fascistas pela centralização do poder nas mãos do seu
“líder”. Por isso o assunto tende a ser recorrente. A todo o momento, vez ou
outra, “a cadela no cio do fascismo” tenderá a mostrar a sua tara por um
governo ditatorial.
A contradição, no entanto, da
narrativa é escandalosa. A começar que o mesmo grupo que pede uma “intervenção
militar” (uma ilusão criada por má interpretação do texto Constitucional) é o
primeiro a gritar contra os regimes “comunistas” por serem estes uma ditadura.
A lógica, ou melhor, a falta de lógica é esta: instale-se uma ditadura para
combater a ditadura!
Outra contradição é que quando
manifestações que pedem por um governo militar – nos moldes daquele repressivo
de 1964 a 1985 – são dissolvidas por tropas de choque, os manifestantes
reclamam da “falta de liberdade”.
No último final de semana, novas
ondas de atos contra o isolamento social (por conta da pandemia de coronavírus)
aproveitavam o mote para pedir o fechamento do Congresso e do STF e a
instalação de um governo militar com Bolsonaro como presidente. Contra o
isolamento, os manifestantes dizem que têm direito a ir e vir, “garantido pela
Constituição”. No entanto, o fechamento de dois dos três Poderes é golpe e, por
isso, totalmente contrário ao texto constitucional.
Aliás, usando do seu “direito
constitucional” de liberdade de expressão, manifestantes carregavam cartazes
chamando a Constituição de 1988 de “Carta Magna Comunista”. Aliás, comunista é
termo genérico para tudo. Até o vírus (Covid-19) já foi chamado de comunista.
Afinal, os primeiros casos surgiram na China, então...
O problema é que esse enfrentamento
à democracia em nada ajuda o país. Nem hoje, enquanto vivemos o drama de uma
pandemia, nem ontem e nem amanhã. Esse ódio exacerbado pelo outro, cuja
histeria desenfreada leva ao desejo insaciável pelo autoritarismo deve ser
encarado como doença que avança sem controle. Não se pode conceber que alguém,
em sã consciência, opte deliberadamente por fortalecer um regime governamental
que lhe rouba a liberdade. Não é da natureza humana o desejo pela prisão, seja
ela material ou psicológica.
Em pouco mais de um ano de governo,
já tivemos diversas ameaças à liberdade. Em outubro de 2019, Eduardo Bolsonaro,
filho do presidente Jair Bolsonaro, se pronunciou a favor da reedição de uma
espécie de AI-5 para combater a “esquerda”. Para quem não sabe, o AI-5 foi o
Ato Institucional editado durante o regime militar e que recrudesceu a ditadura
ao suspender todos os direitos civis e individuais dos cidadãos, incluindo o
pedido de habeas-corpus.
No último domingo, dia 19 de abril,
uma manifestação em Brasília pedia novamente a reedição do AI-5. Manifestação
essa saudada pelo presidente. No começo da semana, o presidente recuou e se
disse defensor da democracia.[3]
Mesmo assim, há movimentação de forças políticas solicitando abertura de
inquérito para apurar responsabilidades de políticos envolvidos nessas
manifestações.[4] E
o fantasma do fascismo ainda nos ronda.
Carlos
Carvalho Cavalheiro
21.04.2020
[1] https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2011/04/06/neonazistas-ajudam-a-convocar-ato-civico-pro-bolsonaro-em-sao-paulo.htm
[2] https://www.cartacapital.com.br/tecnologia/a-onda-bolsonaro-e-o-despertar-do-neonazismo/?__cf_chl_jschl_tk__=814d3ad717dd59cc58dd2351ab9d8959d63c3760-1587514337-0-ARCIef2IRfd1D-vDRzVS2_uo1R7d5WA-GYphVdFAea2ftOKtliqgS0sYdzZFwQRJOIK5QEDnuQLLnCe1etVzpN73X3Sly2r57Ka-_N5rjXlmg6qPc3FUdoDKACMlzx9yNcVW2MmM4IVHsAJxIa1rkMUOsIi6efEygw7SEYy19nrCsvkhdiG_NmKOM5E76xLvQitaUDRB9sLSxosEvWNc60MoZT7UnxKZSLWPuf3CjGpHUrmg1OqE1soBCX5f2OgcJqZ4PaP3PAylvCH7Maqp9WCnXQwlIVCm1KhFypglFchPe2gQFbZx1JFyzUd4VgEya6P42u698y0lM8qJt3-USX4
[3]
https://br.blastingnews.com/politica/2020/04/video/apos-participar-de-manifestacao-pedindo-ai-5-bolsonaro-recua-sobre-congresso-e-stf-005351001.html
[4]
https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/politica/2020/04/20/interna_politica,846489/aras-pede-a-stf-inquerito-sobre-atos-que-defenderam-novo-ai-5.shtml