segunda-feira, 15 de julho de 2013

A elegia de um caipira sul-paulista

          Em 2003, as então formandas em jornalismo Naiçara Garbin e Gabrielle Camargo escreveram um livro-reportagem sobre o folclorista Bento Palmiro e solicitaram a mim que fizesse um prefácio. O livro não chegou, infelizmente, a ser publicado... Quem sabe um dia... Porém, como faz 10 anos que escrevi o texto abaixo, quis compartilhá-lo:

  A identidade cultural do caipira do sul de São Paulo ainda permanece como uma incógnita a produzir comichões, vez ou outra, nas sinapses dos nossos neurônios. Há uma cultura sul-paulista? O que é e como se formou essa cultura?

   Muitos foram os que auxiliaram na revelação desses enigmas. Aluísio de Almeida, Waldemar Iglesias Fernandes, Cornélio Pires, Bene Cleto e tantos outros que souberam bem que a cultura paulista do sul do estado possui singularidades que a distinguem da desenvolvida em outras paragens.

   A cultura caipira, do ponto de vista antropológico, é o traço característico mais difundido pelo Brasil. Encontramos tais características em São Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, parte do Rio de Janeiro e do Paraná. Gerada do contato dos ibéricos com os índios, inicialmente em São Paulo, foi acrescentada posteriormente de elementos africanos, alemães, italianos etc... No sul de São Paulo ganhou características próprias até mesmo por influência na região da atividade econômica ímpar a partir de meados do século XVIII, o tropeirismo. 

   Coube a Bento Palmiro de Miranda, caipira de Cesário Lange, a difícil tarefa de cultor e difusor dessa cultura do sul paulista. Talvez nenhum outro tenha se dedicado tão profundamente a desvendar os meandros dessa identidade cultural.

   Folclorista, artesão, fabricante de violas, violeiro, modinheiro, fandangueiro, poeta popular, divulgador das virtudes dos alimentos vegetais... Tantas facetas de um mesmo homem são agora desvendadas pelo esclarecedor trabalho de Gabrielle Camargo e Naiçara Garbin, que realizaram importante pesquisa jornalística resultando na obra “A história do folclorista Bento Palmiro Miranda”.

   Com leitura leve, o livro das jovens jornalistas de Sorocaba encanta pela sincera poesia que permeia cada letra, denotando a paixão que nelas provocou o tema e, para felicidade nossa, expurgando os intrusos e enfadonhos estilos academicistas que costumam a aliciar aqueles que se dispõem a pesquisar e publicar seus estudos. 

  “A história do folclorista Bento Palmiro Miranda”, escrita de forma franca e entusiasta, é a reunião de informações reveladoras e únicas desse que foi um dos mais autênticos paulistas que o sol beijou a fronte. 

   Dormimos mais tranqüilos. Parte de nossa dívida foi resgatada. A biografia de um dos mais importantes folcloristas de São Paulo está agora acessível a todos. E escrita de forma encantadora. Quase uma elegia. Triste como toda elegia, mas também bela. Bela e triste como a figura de Dom Quixote ou como o Jeca de Angelino de Oliveira.

Carlos Carvalho Cavalheiro.
20.10.2003. 

Sugestão de frase para orelha: “Coube a Bento Palmiro a tarefa de cultor e difusor da cultura caipira sul-paulista”.

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