O ministro do STF Luís Roberto
Barroso, em audiência com seus alunos, aparentemente não percebendo que suas
manifestações eram gravadas, deixou escapar a sua insatisfação em relação à
falta de alternância nos governos e disparou a frase: “a política está morta”.
Apesar de chocar num primeiro
momento, a frase de Barroso revela não somente uma percepção daqueles que
acompanham as notícias políticas, mas também daqueles que analisam a democracia
brasileira na atualidade. Aliás, o Brasil sempre teve crise de identidade
política. No Império dizia-se que a diferença entre liberais e conservadores
era somente o exercício do poder, ou seja, um liberal era muito parecido com um
conservador quando ambos estavam no comando. Durante os primeiros anos da
República o Brasil criou o que parecia ser inimaginável: uma República
Oligárquica. Isso porque, na própria etimologia de ambos os termos aparece a
contradição. Na república (res publica,
do latim), a forma de governo pressupõe que o poder emana do povo e tem por
objetivo o bem comum, a “coisa pública”. Na Oligarquia, ao contrário, um
pequeno grupo governa visando apenas seus interesses e não o da coletividade,
não o bem comum.
Em meados da década de 1980, passado
o horror da ditadura militar, o Brasil tomou o caminho oposto ao extremo. Em
vez da falta de partidos ou do bi-partidarismo do final da ditadura, a
democracia brasileira defendeu a idéia do pluripartidarismo, conforme reza a
Carta Magna. Até aí, tudo bem. Não haveria problema algum se houvesse certo
rigor na criação de partidos. Hoje se tem partidos para tudo: aposentados,
militares (ainda não oficializado), indígenas, mulheres... São 35 partidos
registrados no TSE e outros tantos que ainda buscam a legalização. Somente os
partidos que carregam em sua sigla o termo “Trabalhista” temos 5: PARTIDO
TRABALHISTA BRASILEIRO (PTB), PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA (PDT), PARTIDO
TRABALHISTA CRISTÃO (PTC), PARTIDO TRABALHISTA DO BRASIL (PT do B), PARTIDO
RENOVADOR TRABALHISTA BRASILEIRO (PRTB), PARTIDO TRABALHISTA NACIONAL (PTN). Partidos que pretendem atuar em causas ambientais são 4:
Partido Verde (PV), Rede Sustentabilidade (Rede), Partido Ambientalista
Nacional (PAN) e Partido Ecológico Nacional (PEN). Há dois Partidos Comunistas reconhecidos pelo
TSE e outros na clandestinidade, ainda.
Acontece
que uma multiplicidade irrestrita, com propostas que deveriam ser semelhantes –
ou convergentes – favorece apenas uma coisa: a negociação com diversas siglas
para se obter maioria de votos que garantam um mínimo de governabilidade. Nas
eleições de 2014, por exemplo, 28 partidos tiveram pelo menos 1 candidato
eleito. Impossível ao chefe do Executivo obter maioria sem negociar com
significativa parte dessas legendas. Isso porque a nossa Constituição foi promulgada
pensando-se numa possível mudança da forma de governo para o Parlamentarismo.
Consequência disso é que vivemos hoje num sistema em que a figura do presidente
da República é quase que refém do Congresso.
Parte
do descontentamento do ministro Roberto Barroso vem desse quadro que se nos
apresenta, de um número irrestrito de partidos políticos, muitos dos quais com
dificuldades em definir sua ideologia ou distinguir seu programa de ação.
Nesse
sentido, a política – como a arte de bem governar os povos ou como a ação em
benefício da comunidade – se esvai, ou como disse o ministro Barroso, morre e
deixa em seu lugar o balcão de negociatas. E pior: abre espaço para outras
supostas “alternativas”: o movimento pelo retorno da monarquia vem se
fortalecendo ao mesmo passo em que se robustece, também, o que clama pela
intervenção militar. Se a política está morta hoje, amanhã poderá ser
enterrada.
Carlos Carvalho Cavalheiro
04.03.2016
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