segunda-feira, 18 de outubro de 2010

O Turismo (possível) em Sorocaba

Em 2005, fui contratado por uma revista - intitulada Síntese - para escrever uma série de artigos sobre assuntos variados, a começar por turismo em Sorocaba. Vasculhando as velhas pastas do meu computador, encontrei os dois artigos iniciais (a Revista não foi para frente e acabei não terminando a série). Resolvi publicá-los aqui, a despeito da defasagem (já se vão cinco anos!) e sem revisão ou atualização, apenas como curiosidade. Na época pretendia, ainda, abordar outros temas como o turismo em locais "assombrados", a exemplo da South Bridge na Escócia e Hampton Court na Inglaterra. Em Sorocaba temos o famoso Casarão dos Padres, próximo ao Shopping Panorâmico (Antigo Shopping Regional). Penso que até os fenômenos ufológicos - que em Sorocaba são demasiados - podem ser aproveitados como roteiro turístico (levando-se em consideração até a organização de eventos ligados ao tema, como Seminários etc). Abaixo, seguem os textos.



O Turismo (possível) em Sorocaba - Parte I.

No ano de 2002 a Prefeitura Municipal de Sorocaba em parceria com dez hotéis e três instituições educacionais da cidade realizaram a Pesquisa de Demanda Turística, divulgada pela Secretaria de Desenvolvimento Econômico (SEDE) no site oficial do Paço. Uma das conclusões da pesquisa é a forte vocação de Sorocaba para o turismo de negócios.
Sem desmerecer a pesquisa, nem questionar a metodologia empregada e muito menos discordar radicalmente da conclusão chegada, é importante que se compreenda que Sorocaba possui potencial turístico para outras atividades que não a de negócios. Forte vocação não é fator excludente de outras vocações. Pode-se mesmo aventar que o resultado da pesquisa traduza a ânsia da classe dominante sorocabana em criar uma representação ideológica que acabe por apagar os resquícios de um passado, de uma identidade cultural de Sorocaba. Isso justificaria a falta de investimento para o desenvolvimento do turismo ligado às tradições tropeiras, por exemplo. Não é concebível que uma cidade como Sorocaba não aproveite esse potencial, levando-se em conta, ainda, que a região produz atrativos nessa área e Sorocaba poderia funcionar como fornecedora de infra-estrutura (hospedagem, opções de lazer, compras...), aproveitando sua rede hoteleira, os bares, shoppings, lanchonetes. Sorocaba perdeu a oportunidade de desenvolver o turismo ecológico, o turismo histórico e perde, dia a dia, outras oportunidades.
Provavelmente, um dos setores que vem sendo pouco atendido é o do turismo religioso. Esse segmento recebeu especial atenção da Secretaria de Estado de Esportes e Turismo, na primeira gestão do governador Geraldo Alckmin, merecendo a publicação de um Guia do Roteiro da Fé. Na apresentação do Guia, a mensagem do Secretário Marcos Arbaitman deixa claro que a opção pelo desenvolvimento do turismo religioso é por ser esta uma “atividade econômica geradora de novos postos de trabalho e renda”, melhorando a qualidade de vida da comunidade. Por uma infeliz coincidência, Sorocaba está excluída desse Guia. Não há uma sequer referência a festa ou manifestação de cunho religioso existente na cidade.
E por quê? Por falta de opção para desenvolver o turismo religioso? Não pode ser. Sorocaba possui o segundo templo, em antiguidade, dedicado a Nossa Senhora Aparecida. No bairro de Aparecidinha, onde está localizada essa igreja, há um fluxo de romarias intenso. No começo do ano, a imagem de Nossa Senhora sai do seu altar em procissão até a Catedral, onde permanece por seis meses e retorna ao bairro de origem, como nova romaria. Em novembro, dia 15, sai a Romaria da Penitência, da Catedral até a igreja de Aparecidinha. E, ainda, um domingo por mês, um grupo de romeiros realiza a mesma caminhada partindo da Avenida São Paulo. Isso sem a menor infra-estrutura (ruas de terra em péssimo estado, falta de hospedarias e atendimento médico, precário sistema de transporte, escassez de restaurantes e lanchonetes; falta de atrações outras e de exploração de artesanato religioso). Mesmo assim, o resultado é o afluxo de milhares de fiéis. O que não seria se houvesse um turismo racional e organizado? A própria comunidade seria beneficiada, pois poderia vender os mais diversos artesanatos com etiquetas indicando sua procedência: Aparecida de Sorocaba.
A segunda igreja de Nossa Senhora Aparecida do Brasil (e do mundo)! Qual maior apelo turístico do que esse?
Outro exemplo: A Festa de São Benedito, que ocorre nos primeiros dias de janeiro, na Igreja do Bom Jesus dos Aflitos. É uma das maiores festas dedicadas ao Santo Negro do Estado de São Paulo. Quem testemunha isso? A Rainha Congo de São Paulo, que no último Revelando São Paulo , comentou que a Festa de Sorocaba está entre as mais belas e concorridas homenagens a São Benedito. E a Rainha participa das principais!
E o que falar de João de Camargo, o negro milagreiro da Igreja do Bairro da Água Vermelha. Sua fama corre por todo o Brasil e já é tema do filme de Paulo Betti, Cafundó. Tanto a sua Igreja como o seu túmulo, especialmente no dia de Finados, recebem um número fabuloso de visitas de fiéis à procura de um milagre ou somente para conhecer o afamado templo. E o que se tem feito para receber (bem) esses turistas? E para divulgar esse atrativo turístico?
E a Folia de Reis da Vila Formosa? Todo ano saindo em jornada (a partir de outubro) e realizando em janeiro a Festa de Santos Reis, esse grupo folclórico-religioso cumpre a saga dos Três Reis do Oriente, que visitaram o menino Jesus logo após o seu nascimento. Fé e devoção que atrai muitos. Mas, o que se tem feito para divulgar essa manifestação com vistas ao turismo religioso?
A Menina Julieta, santinha de Sorocaba; o Monge do Ipanema; Monsenhor João Soares do Amaral... Tantos apelos para o desenvolvimento do turismo religioso em Sorocaba.
É sintomático que a pesquisa de demanda turística, comentada no início deste artigo, tenha chegado também a uma outra conclusão: Atrativos do município precisam ser melhor divulgados. E se divulgados, devem ainda merecer atenção das políticas públicas relativas ao desenvolvimento do turismo na cidade. O turista deve ser bem informado e bem atendido. Caso contrário, perderemos a chance de desenvolver outros segmentos do turismo.

Carlos Carvalho Cavalheiro.
08.11.2005.


O Turismo (possível) em Sorocaba - Parte II.

Na primeira parte deste artigo comentou-se sobre a Pesquisa de Demanda Turística de 2002 que aponta para Sorocaba a opção pelo turismo de negócios. A partir dessa conclusão da pesquisa, procurou-se ampliar o debate sobre as outras possibilidades de desenvolvimento do turismo na cidade, mencionando o descaso com que vem sendo tratado o turismo religioso.
Sorocaba possui, redundando os argumentos do artigo anterior, diversos apelos turísticos voltados a diversas manifestações religiosas, quer sejam de cunho católico, místico, espiritualista ou mesmo de crenças populares. Veja, por exemplo, o caso da Encenação da Paixão de Cristo em Vila Assis. Todo ano milhares de pessoas se reúnem para assistir a esse espetáculo de fé e dramaturgia, sendo talvez o maior espetáculo teatral a céu aberto de toda a região. Apoio, divulgação, infra-estrutura? Quase nada. No Parque Vitória Régia a Encenação da Paixão de Cristo passa por semelhantes dificuldades, se não maiores.
Entretanto, Sorocaba detém outras qualidades que poderiam angariar turistas. O folclore peculiar do Médio Tietê, região da qual Sorocaba faz parte, poderia estar sendo evidenciado e enaltecido através de Festivais, como o de Olímpia ou mesmo o Revelando São Paulo na capital.
O cururu, repente paulista encontrado somente nesta região, ao lado das Festas e Folias do Divino Espírito Santo, representa o que há de mais característico no folclore do Médio Tietê. E o folclore regional não fica só nisso: contadores de causos e mentiras, dança de São Gonçalo, catira, fandango de tamancos e de chilenas, Folia de Reis, Congadas, Folia de São Sebastião, violeiros, Caninha Verde, Recomenda das Almas, samba caipira, Cordão dos Bichos, jogo de truco, terço cantado, benzeduras, romarias e procissões... Tudo isso a região produz.
As cidades que se dispuseram a apostar na criação de festivais e encontros de folclore tiveram experiências muito gratificantes. Altinópolis, localizada na região de Ribeirão Preto, criou há algumas décadas o Encontro de Folias de Reis. A população que é de cerca de 14 a 15 mil habitantes, duplica nos dias do Encontro. A Prefeitura Municipal oferece a infra-estrutura (palcos, som, iluminação, material de divulgação...) e uma Associação realiza o evento. É certo que há um acanhado investimento em hospedarias. Porém, no geral, a festa acontece com sucesso. Em Olímpia, com o Festival de Folclore, a realidade é a mesma. Este ano a cidade realizou o seu 40º Festival. Grupos folclóricos de todos os estados brasileiros se apresentaram em Olímpia e a programação contou ainda com a realização de Seminário, de peregrinação pela cidade, gincana de brinquedos tradicionais infantis. Sorocaba é uma das poucas cidades que não participam do Festival.
Na cidade de Embu, a Prefeitura Municipal resolveu intervir na Festa de Santa Cruz, que estava em vias de extinção. Auxiliou os fiéis e ofereceu infra-estrutura. No primeiro ano da Festa foi necessário que os remanescentes de grupos de devotos de Santa Cruz se juntassem para formar um só grupo.Isso em 2001. Hoje,a cidade já conta com três grupos de adoradores de Santa Cruz. E a Festa não se resume a isso: apresentação de diversos grupos folclóricos e para-folclóricos, realização de debates, exposição.
Qual a vantagem em investir em turismo folclórico? Além do retorno financeiro o turismo voltado a festivais de folclore contribui para a valorização, conhecimento e reconhecimento da identidade cultural do brasileiro, aumentando a auto-estima dos participantes dos diversos grupos folclóricos, auxiliando assim na preservação de nossas tradições. Não fosse pelo aspecto econômico de geração de renda para o município, o investimento em turismo voltado para o folclore traz um retorno no aspecto da cidadania. Portanto, mesmo que não gerasse lucro, os festivais de folclore deveriam existir por atender às obrigações legais do Poder Público: zelar pela cultura, pela identidade cultural, pelo patrimônio imaterial e pela cidadania. Quanta vantagem, então, para o Poder Público em cumprir o seu dever e ainda obter receita para o município. Fica a pergunta: Por que não se investe nesse segmento do turismo?

Carlos Carvalho Cavalheiro.
09.11.2005.

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