segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Um Conselho para a Cultura (I)


                O jornal Tribuna das Monções do dia 30 de novembro de 2013 publicou nota dando conta da reativação – após um período de seis anos de inatividade – do Conselho Municipal de Cultura. É um avanço porquanto a Cultura, infelizmente, comumente é tratada como “perfumaria”, como supérfluo, tanto na percepção da opinião pública de forma geral como pela Gestão Pública que nem sempre desenvolve políticas adequadas para essa área.
                Um erro bastante recorrente do Poder Público, quando este aceita que a Cultura tenha alguma relevância para a sociedade, é acreditar que o seu papel seja o da promoção de eventos artísticos. Basta perguntar a um gestor público dessa área qual é a política cultural adotada é logo se recebe como resposta um rosário de eventos promovidos: apresentação de dança, apresentação de música, exposição de fotografias etc etc. No entanto, isso não é Política Cultural.
                Cultura, numa perspectiva antropológica, pode ser definida, se quisermos um conceito bastante amplo, como o conjunto das criações humanas e que tem por objetivo atender aos anseios dos seres humanos, sejam estes materiais ou imateriais. Portanto, cultura é indissociável do ser humano por ser uma criação deste. Dentro do leque de ações que compõe o campo da cultura, a arte é um dos seus aspectos. Entretanto, compõe a Cultura as crenças, os costumes, as religiosidades, a memória, a História, os valores, a gastronomia, a língua e o linguajar, as lendas, enfim, o arcabouço das características e da criação de um povo.
                Portanto, a reativação do Conselho Municipal de Cultura de Porto Feliz é uma notícia alvissareira. Por quê? Retomemos o histórico do Conselho. Criado em 10 de abril de 1997, por meio da Lei nº 3528, o Conselho Municipal de Cultura tem por finalidade legalmente definida ser um “órgão de cooperação governamental, que tem por finalidade auxiliar a Administração Municipal na orientação, planejamento, fiscalização e julgamento das matérias de sua competência, ligadas à cultura e ao patrimônio ambiental urbano”. Como se pode verificar, a área de atuação do Conselho é deveras abrangente, embora muito importante no sentido de apontar caminhos para a realização de uma Gestão Pública Cultural.
                O Conselho pode, por exemplo, iniciar a discussão em torno da melhor forma de se trabalhar a cultura do ponto de vista do Poder Público: se através de administração da cultura ou gestão cultural.
A administração da cultura, que é a forma mais comum e disseminada do Poder Público lidar com essa temática, ou fundamentar sua política cultural, é a visão do Estado controlando, produzindo ou patrocinando cultura. Esse modelo, anacrônico e pouco funcional, em que pese a boa vontade de alguns dirigentes culturais, é excludente e elitista. À medida que se tende a patrocinar somente àqueles que se alinham com a política cultural dos representantes do Poder Público, atitude essa esperada da natureza humana, exclui-se do processo de produção cultural uma gama de outros produtores tão bons ou melhores do que os beneficiados. Ademais, o administrador da cultura procura dissimular as falhas de sua política cultural (afinal, omissão também pode ser considerado um ato político) produzindo cultura através da elaboração dos mágicos "calendários" culturais em que se privilegia a promoção de eventos desconexos e descontextualizados, geralmente, e sem atender a uma real necessidade da comunidade. Daí surgirem conceitos equivocados como "levar cultura" ou "ensinar cultura" aos locais descentralizados.
Na abertura desta discussão estabeleceu-se que a cultura é indissociável do ser humano. Assim, de uma forma ou de outra, somos todos capazes de produzir e apreciar cultura. Então, não é "levando cultura" que se desenvolve cultura. É, antes, incentivando e criando condições para que ela se desenvolva. O homem produz cultura espontaneamente, se não expõe seu produto é porque lhe faltam condições, até mesmo de conscientização, para reconhecer como produto cultural àquilo que tão naturalmente ele cria.
Por outro lado, o modelo de gestão cultural propõe a criação de condições (estruturais, materiais, financeiras...) para a produção cultural, a todos, com liberdade de crítica e de criação aos produtores culturais e primando pela não exclusão, visando o respeito, a cidadania e a liberdade. Ao Poder Público, como gestor cultural, cabe criar essas condições e direcionar a política cultural para esses fins.
O gestor não é apenas o administrador dos recursos financeiros destinados à cultura. Ele se utiliza desse expediente para criar o plano de gestão da cultura. Por intermédio desse plano estabelecem-se as metas e prioridades para a área cultural, levando em consideração as necessidades da comunidade, seus aspectos históricos e geográficos, sua formação étnica, sua realidade socioeconômica etc... A seguir, realiza o levantamento das atividades culturais e dos produtores de cultura da comunidade e seus problemas e seus desejos. A partir desse mapeamento, procura criar as condições para a produção cultural inclusiva.

(Continua)
Carlos Carvalho Cavalheiro – 16.12.2013.

                

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