O eminente Sérgio Buarque de
Holanda, em seu livro “Raízes do Brasil”
nos ensina que “Aos portugueses e, em
menor grau, aos castelhanos, coube, sem dúvida, a primazia no emprego do regime
que iria servir de modelo à exploração latifundiária e monocultora adotada
depois por outros povos”. E qual a base do trabalho explorado nesse regime?
O escravo.
Disso se deduz que algo de herança
dessa época ainda nos serve de parâmetro. No sistema escravocrata, não há, como
ressalta o próprio Sérgio Buarque de Holanda e, também, Paulo Freire, espaço
para a solidariedade – aqui entendida como a colaboração entre as pessoas – e
para o diálogo. No entanto, sobra, por uma necessidade do próprio sistema, como
azeite para a máquina, uma ânsia quase incontrolável pela punição. As menores
faltas, no escravismo, eram punidas severamente. E não é exclusividade
brasileira, mas sim de todos os lugares onde a escravidão econômica floresceu
como bem denuncia Solomon Northup no seu livro “12 anos de Escravidão”.
Temos uma vontade de punir. Não
interessa muito a quem ou sob quais circunstâncias. Mesmo a nossa atração por
números e estatísticas – gosto que se evidencia principalmente nas eleições e
nos campeonatos de futebol – é suficiente para demover-nos desse intento. De
acordo com dados da Secretaria de Segurança Pública do Ministério da Justiça,
apenas 0,9% dos crimes cometidos em todo o País são realizados por pessoas que
possuem entre 16 e 18 anos, sendo que de todos esses casos, 0,5% são homicídios
(incluindo as tentativas). Mas há outro gosto, um quase vício do brasileiro:
acreditar nas percepções transmitidas por meios de comunicação, sobretudo
televisão e, de um tempo para cá, redes sociais do mundo virtual.
Anualmente, só para citar um exemplo,
são enviadas por e-mail ou postadas nas redes sociais a “informação” de que os
“deputados” aboliram o 13º salário do trabalhador. Ora, o artigo 7º, inciso
VIII, que garante o 13º salário está incluindo dentro daquelas cláusulas
pétreas mencionadas no parágrafo 4º do artigo 60, da mesma Constituição,
sobretudo no inciso IV das garantias e direitos individuais. Sendo cláusula
pétrea, ainda que haja pensamento contrário, não pode ser modificada e nem
mesmo discutida essa possibilidade. No entanto, as pessoas ainda continuam
acreditando nos boatos (hoax). Da mesma forma que acreditam que os maiores
criminosos, os mais violentos e os principais elementos do crime organizado são
os adolescentes. Mesmo que as estatísticas desmintam plenamente. Por isso, o desejo
de punir aparece agora com a possibilidade da redução da maioridade penal.
Coincidentemente, dos países mais
desenvolvidos, apenas os Estados Unidos, que passou pelo processo de escravidão
e viu nascer em seu solo uma cruel discriminação racial, é que insistem em
adotar a penalidade para adolescentes de 12 a 16 anos, até mesmo com prisão
perpétua ou pena de morte. Do outro lado, países como Japão e Inglaterra, que
admitem a maioridade penal para adolescentes, estão debatendo nesse momento a
elevação da maioridade. Isso em países onde há uma relativa infraestrutura que
atinge a Educação e o bem estar social.
No entanto, o Brasil não oferece o
mesmo nível de Educação de qualidade – a principiar pela péssima remuneração
dos professores e pelo excesso de alunos em salas de aula – mas quer punir os
adolescentes com penas mais severas. Isso porque, talvez, não consiga punir os
“donos do poder” que não apresentam alternativas para evitar que o adolescente
caia na criminalidade, antes de pensar em puni-lo. Um exemplo prático é o
trabalho que a Organização Social Abaçaí começou a realizar em Rafard. A falta
de perspectivas para crianças e adolescentes têm levado muitos a procura das
drogas. Em pouco tempo de trabalho, alguns meses, a Abaçai já vem arregimentando
um número de jovens que estão encontrando um sentido para a vida nas atividades
realizadas no Casarão da Tarsila do Amaral. Provavelmente, o índice de
criminalidade entre os jovens deverá cair naquela cidade, muito em breve. E
disso já nos alertava Pitágoras, há mais de 2000 anos: “Educai as crianças e
não será preciso punir os homens”.
Carlos
Carvalho Cavalheiro
07.04.2015
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