segunda-feira, 20 de julho de 2015

Uva, Vinho e Saci-Pererê – Parte 2


[Porto Feliz: Muito além das Monções]

            “A família Pelegrini, uma das mais tradicionais de Porto Feliz mantém consigo, há quatro gerações, a arte de produzir seu próprio vinho de forma essencialmente artesanal, em sua adega que fica no coração da Vila Progresso”. A tradição começou por volta de 1945, quando Atílio Pelegrini, pai do Valdemar Pelegrini, aperfeiçoou a produção vinícola que fazia parte da família desde, pelo menos, 1917. Até então se fazia vinho naquele clã para consumo próprio e de forma rudimentar.
A história dos Pelegrini (e todas as variantes, como dois “L”, com “E” no final do nome, etc.) no Brasil se mistura com a dos outros imigrantes que vieram para cá em busca de melhores condições de vida nas décadas finais do século XIX. Conta o próprio Valdemar Pelegrini que seus ancestrais vieram de Veneza, na Itália, para o Brasil em 1890. Nesse ano desembarcaram no Porto de Santos. Uma parte da família tentou a sorte no sul do país. A outra foi para o interior paulista.
Segundo nos contou Valdemar Pelegrini, “Com a crise do café, os imigrantes italianos se mudaram para a parte central de nosso Estado; iniciava-se a fase áurea da cana de açúcar. Entre os muitos imigrantes dessa epopeia, estava também o ancestral da família, Guilherme (Guglielmo) Pelegrini, que embora tivesse chegado só, teve o cuidado de trazer consigo, sementes de algumas variedades de uvas que passou a cultivá-las em nossa região”.
Para Valdemar, a produção de um bom vinho, não tem muitos mistérios, “eis que é uma decorrência da fermentação natural da uva, todo o trabalho embora artesanal, carrega consigo o toque pessoal de seu artesão”. Para exemplificar o que afirma, o advogado e vinicultor costuma contar a lenda do vinho: “Na Pérsia, no reino de Jamshid, as uvas eram armazenadas em jarros de grande capacidade para serem consumidas nas entre safras, e em um dado momento, um dos jarros começou a espumar e a exalar um cheiro agradável forte e desconhecido, que acreditando-se tratar de um veneno, foi deixado em segundo plano. Foi quando uma jovem escrava do castelo, desiludida pelo amor não correspondido da parte do príncipe, tentou suicídio, ingerindo grande quantidade daquele líquido espumante, tido como veneno. Eis que, em vez de ter encontrado a morte, sentiu-se alegre, ligeiramente sonolenta e, desse modo, passou a cantarolar pelo palácio. Sabendo o Rei de tal façanha, pediu a seus súditos que refizessem novas quantidades daquela coisa fervilhante, para que toda sua corte desfrutasse daquela poção maravilhosa. Estava descoberta a mais antiga bebida do mundo”.
A lenda acima demonstra a suposta simplicidade na produção do vinho: a natureza faz a parte maior que é a fermentação. Uma das fontes mais antigas do uso do vinho está em Gênesis, o primeiro livro da Bíblia, que no seu capítulo 9 informa que Noé era cultivador de uvas e que fabricou vinho, ficando embriagado. De fato, o vinho é uma das mais antigas bebidas alcoólicas do mundo.
O processo de produção do Vinho Pelegrini diferencia-se pelo fato de todo o cuidado especial dispensado pelo Valdemar. Desde o cultivo da uva até o engarrafamento, todo o processo passa pelas suas mãos e cuidado. Um desses cuidados está em relação à coloração da casca da uva, pois é ela quem tingirá a bebida.
Segundo Valdemar Pelegrini, “o processo não utiliza adubos químicos ou defensivos organoclorados, resultando assim em uma qualidade próxima à excelência, eis que, após amassadas, as frutas são levadas a uma tanque de fermentação rápida por sete dias, com casca e sementes. Durante esse período, é que a coloração das cascas passam a tingir o líquido do composto, que será a nova bebida. Ao longo de mais 120 dias, com o líquido já separado das sementes e cascas, uma fermentação lenta se processará até o final do inverno em garrafões de 50 litros, onde se aprimorará a qualidade, como coloração que deve ser brilhante, de cheiro agradável, teor alcoólico ideal, e retrogosto específico de cada variedade”.
Na Adega Pelegrini, localizada na própria Chácara, no coração da Vila Progresso, pode-se adquirir o vinho, bem como, com reserva feita com antecedência, é possível apreciar uma lauta e caseira refeição servida em ambiente agradável e acolhedor. Há acomodação suficiente para grupos de até cem pessoas, que além da refeição, do vinho, das uvas e do Saci, poderão ainda ouvir as interessantes e construtivas histórias do Valdemar Pelegrini e sua companheira. Uma atividade tão agradável que poderia constar, sem nenhum favor, nos informativos oficiais de Turismo da cidade.

PS – Se a Vila Progresso é conhecida como “Último Gole”, será que o primeiro já era servido na Chácara Pelegrini? Brincadeira.

Carlos Carvalho Cavalheiro
28.12.2014



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