[Porto Feliz: Muito além das Monções]
“A
família Pelegrini, uma das mais tradicionais de Porto Feliz mantém consigo, há
quatro gerações, a arte de produzir seu próprio vinho de forma essencialmente
artesanal, em sua adega que fica no coração da Vila Progresso”. A tradição
começou por volta de 1945, quando Atílio Pelegrini, pai do Valdemar Pelegrini,
aperfeiçoou a produção vinícola que fazia parte da família desde, pelo menos,
1917. Até então se fazia vinho naquele clã para consumo próprio e de forma
rudimentar.
A história dos Pelegrini (e todas as
variantes, como dois “L”, com “E” no final do nome, etc.) no Brasil se mistura
com a dos outros imigrantes que vieram para cá em busca de melhores condições
de vida nas décadas finais do século XIX. Conta o próprio Valdemar Pelegrini
que seus ancestrais vieram de Veneza, na Itália, para o Brasil em 1890. Nesse
ano desembarcaram no Porto de Santos. Uma parte da família tentou a sorte no
sul do país. A outra foi para o interior paulista.
Segundo nos contou Valdemar Pelegrini, “Com a
crise do café, os imigrantes italianos se mudaram para a parte central de nosso
Estado; iniciava-se a fase áurea da cana de açúcar. Entre os muitos imigrantes
dessa epopeia, estava também o ancestral da família, Guilherme (Guglielmo) Pelegrini, que embora
tivesse chegado só, teve o cuidado de trazer consigo, sementes de algumas
variedades de uvas que passou a cultivá-las em nossa região”.
Para Valdemar, a produção de um bom vinho,
não tem muitos mistérios, “eis que é uma decorrência da fermentação natural da
uva, todo o trabalho embora artesanal, carrega consigo o toque pessoal de seu
artesão”. Para exemplificar o que afirma, o advogado e vinicultor costuma
contar a lenda do vinho: “Na Pérsia, no reino de Jamshid, as uvas eram
armazenadas em jarros de grande capacidade para serem consumidas nas entre
safras, e em um dado momento, um dos jarros começou a espumar e a exalar um
cheiro agradável forte e desconhecido, que acreditando-se tratar de um veneno, foi
deixado em segundo plano. Foi quando uma jovem escrava do castelo, desiludida
pelo amor não correspondido da parte do príncipe, tentou suicídio, ingerindo
grande quantidade daquele líquido espumante, tido como veneno. Eis que, em vez
de ter encontrado a morte, sentiu-se alegre, ligeiramente sonolenta e, desse
modo, passou a cantarolar pelo palácio. Sabendo o Rei de tal façanha, pediu a
seus súditos que refizessem novas quantidades daquela coisa fervilhante, para
que toda sua corte desfrutasse daquela poção maravilhosa. Estava descoberta a
mais antiga bebida do mundo”.
A lenda acima demonstra a suposta
simplicidade na produção do vinho: a natureza faz a parte maior que é a
fermentação. Uma das fontes mais antigas do uso do vinho está em Gênesis, o
primeiro livro da Bíblia, que no seu capítulo 9 informa que Noé era cultivador
de uvas e que fabricou vinho, ficando embriagado. De fato, o vinho é uma das
mais antigas bebidas alcoólicas do mundo.
O processo de produção do Vinho Pelegrini
diferencia-se pelo fato de todo o cuidado especial dispensado pelo Valdemar.
Desde o cultivo da uva até o engarrafamento, todo o processo passa pelas suas
mãos e cuidado. Um desses cuidados está em relação à coloração da casca da uva,
pois é ela quem tingirá a bebida.
Segundo Valdemar Pelegrini, “o processo não
utiliza adubos químicos ou defensivos organoclorados, resultando assim em uma
qualidade próxima à excelência, eis que, após amassadas, as frutas são levadas
a uma tanque de fermentação rápida por sete dias, com casca e sementes. Durante
esse período, é que a coloração das cascas passam a tingir o líquido do
composto, que será a nova bebida. Ao longo de mais 120 dias, com o líquido já
separado das sementes e cascas, uma fermentação lenta se processará até o final
do inverno em garrafões de 50 litros, onde se aprimorará a qualidade, como
coloração que deve ser brilhante, de cheiro agradável, teor alcoólico ideal, e
retrogosto específico de cada variedade”.
Na Adega Pelegrini, localizada na própria
Chácara, no coração da Vila Progresso, pode-se adquirir o vinho, bem como, com
reserva feita com antecedência, é possível apreciar uma lauta e caseira
refeição servida em ambiente agradável e acolhedor. Há acomodação suficiente
para grupos de até cem pessoas, que além da refeição, do vinho, das uvas e do
Saci, poderão ainda ouvir as interessantes e construtivas histórias do Valdemar
Pelegrini e sua companheira. Uma atividade tão agradável que poderia constar,
sem nenhum favor, nos informativos oficiais de Turismo da cidade.
PS – Se a Vila Progresso é conhecida como
“Último Gole”, será que o primeiro já era servido na Chácara Pelegrini?
Brincadeira.
Carlos Carvalho Cavalheiro
28.12.2014
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